Figuras Populares
Muito avisadamente, o ilustre montalvanense Dr. António Cardoso Mourato - um dos que merece inteiro destaque, não só pelos testemunhos materiais que nos deixa da sua dedicação a Montalvão, como pelo exemplo que é para todos nós, atendendo ao seu percurso de vida – no livro que coordenou, aqui recorrentemente citado e objeto de publicação no separador respetivo (1), no Capítulo “Alguns casos de Montalvanenses dignos de registo”, página 145, prevenia que “É este um tema um pouco polémico e muito discutível. Quem merece ser aqui mencionado?...”que ninguém fique ofendido com a simples enumeração de alguns casos, ou com a ausência de outros, não incluídos aqui”….
A recordação que fazemos nos separadores específicos em “Arte e Cultura Popular” dos nomes dos diferentes protagonistas, é, em si mesmo, uma evocação das suas pessoas, pelo que fizeram no passado, e, por consequência, uma merecida homenagem, muito singela, é certo, mas justa lembrança.
De entre tais pessoas, e neste capítulo da arte e da cultura popular montalvanense, há, no entanto, uma personalidade que se destaca das demais, por múltiplas e variadas razões e que nos parece, objetivamente, ser credora da consideração e simpatia da generalidade dos seus conterrâneos e, muito particularmente, dos muitos jovens de outrora que com ele conviveram, com ele aprenderam, conheceram novas artes e gentes e outras terras.
Chegados aqui, torna-se fácil concluir que se trata do Senhor António José Belo, personalidade multifacetada, do qual a arte e a cultura popular de Montalvão tanto beneficiaram, ao longo de vários anos. De acordo com aquele livro (p. 127) (1), já em 5 junho 1944, no âmbito da “Exposição das Actividades Corporativas do Distrito de Portalegre”, a condigna representação da Casa do Povo de Montalvão, constituída por rapazes e raparigas, foi dirigida por António José Belo.
A sua ação polivalente, empreendedora e competente, encontra-se ainda muito presente na memória de muitos que com ele conviveram mais de perto, em termos sociais ou fruto da sua ação cultural, expressando-se essa ação no Grupo Cénico, no Rancho Folclórico, no artesanato, na poesia popular ou em várias outras das suas facetas. É raro, encontrar uma pessoa que congregue tantas vocações …”sem nunca ter ido à Escola”…, como rimou numa das suas múltiplas quadras.
Em termos pessoais e de vida familiar, foi outro exemplo para todos nós, de simplicidade, de dignidade e de labuta, tal como, aliás, em relação à cidadania, dado ter desempenhado durante vários anos, cumulativamente, os cargos de Presidente da Casa do Povo de Montalvão e de Secretário do Conselho Fiscal da Santa Casa da Misericórdia de Montalvão, nomeadamente nos mandatos compreendidos entre 1983 e 1992.
Muito haveria para dizer, sobretudo por quem o conheceu na intimidade, como foi o caso, mais uma vez, do Dr. António Cardoso Mourato, a quem se deve a “Apresentação deste Livro e do seu Autor” , in “O Meu Livro” de António José Belo, p. 11, onde é feita uma descrição mais intimista e sentida desta figura ímpar da nossa cultura local.
Aqui, preferimos que seja o próprio a dar-se a conhecer, pela forma lapidar como o fez, conforme se verá seguidamente:
I
Mil novecentos e doze,
Data em que eu nasci,
Foi para mim tão famoso
Ano que eu nunca esqueci.
II
Eu aprendi estas letras
Sem nunca ter ido à Escola,
Sem ter lápis nem canetas,
Sem ter livros nem sacola.
III
Em breves explicações
Eu aprendi o que sei.
Se tivesse ido mais longe,
Não ficava onde fiquei.(2)
Ou, finalmente,
Fui poeta e romancista
Fui artesão, fui pintor
Alguns tempos fui fadista
Também fui trabalhador.(2)
António José Belo e esposa Maria do Rosário Catarino (3)
No que respeita ao Grupo Cénico ou Grupo de Teatro de Montalvão, bem como ao Rancho Folclórico de Montalvão, designadamente a partir da década de sessenta, é forçoso evocarmos a figura do Pároco de então, Padre José António dos Santos, igualmente referenciado por António Cardoso Mourato no livro a que já aludimos(1). As fotos que apresentamos em “Memórias de Antigamente” neste "sítio" ou mais especificamente sobre aqueles agrupamentos, são bem o testemunho da cumplicidade e da sólida amizade que existia entre estas duas personalidades marcantes da vida social e cultural de Montalvão.
Noutra perspetiva, o igualmente saudoso Pe. José António, como o conhecíamos, foi muito importante e determinante até para a vida de muitos jovens montalvanenses, dado que a parceria que formou com os Professores Louro e António Pires Lopes, proporcionaram a muitos as condições básicas para singrarem na vida estudantil e profissional. Efetivamente, ao lhes proporcionarem que obtivessem em Montalvão o 1º ciclo do ensino liceal (assim designado na altura), catapultaram-nos para um percurso académico que, em muitos casos, culminou com a obtenção de licenciaturas em diversos domínios e carreiras profissionais bem-sucedidas.
Pe. José António dos Santos e António José Belo (4)
Luís Gonçalves Gomes
01 fevereiro 2016
(1) MOURATO, António Cardoso, "Montalvão, Elementos para uma Monografia desta Freguesia do Concelho de Nisa; 1980
(2) BELO, António José, O Meu Livro, edição do Autor; 1988; pp. 7 e 9, respetivamente.
(3) Fotos originais gentilmente cedidas pelo Senhor Coronel José Maria Belo, filho do casal.
(4) Idem.