…” Ó SÔR AGENTE, POR AQUI VOU BEM PARA O MONTE POMBO?
Foi quase há uma vintena de anos, quinze dos quais em “alta competição”, a dar à perna e para que a forma surgisse na pista tínhamos de devorar quilómetros em estrada, praia e campo, com extensas rampas enlameadas. Neste sentido arrancávamos do Estádio José Alvalade até à Serra de Monsanto, pulmão de Lisboa por excelência, passando pela Segunda Circular onde, em 1976, Carlos Lopes, preparando-se para os Jogos Olímpicos de Montreal, foi atropelado, isto a quinze dias do grande evento, mas mesmo assim conseguiu ser vice-campeão, perdendo apenas para o finlandês Lasse Viren, com quem convivi, vinte e tal anos depois, em sua casa sobranceira a um extenso lago.
Cabe aqui um pouco de história sobre a vitória do “finlandês voador” e seus colegas de fundo e meio-fundo. É que esta famosa equipa preparava-se em altas montanhas de países como o Quénia. Aqui trabalhavam meses a fio e no momento próprio era-lhes retirado parte do seu sangue que, altamente oxigenado, lhes viria a ser administrado ao nível do mar aquando das mais prestigiantes competições. Daí os “finlandeses voadores”, pudera! Era um “doping” encapotado, mas que dada a sua complexidade se tornava difícil confrontar e punir.
Não raras vezes nos percursos de estrada éramos alvo dos mais variados piropos como “vão trabalhar malandros”, como se a seguir ao duche fossemos relaxar. No meu caso saía do Estádio e vinha directo para o Jornal “Diário Popular”, no Bairro Alto, onde, para além deste diário, também se compunha “A Bola”, o “Record” e várias revistas.
Neste trajecto, Saldanha, Marquês, Avenida da Liberdade, aquivirava à Praça da Alegria, e era um salto para o velhinho Bairro Alto.
Descia eu a concorrida Avenida quando, no cruzamento a seguir ao Parque Mayer, dou de caras com um agente policial a comandar o trânsito. Quase encostei o 1602 às calças da autoridade, ao mesmo tempo que lançava a bojarda: “Ó Sôr agente, por aqui vou bem para o Monte Pombo”? Virou-se e com aquela cara que os polícias de antanho “punham” para mostrarem quem eram (!) e, quando se preparava para dar a sua voz de comando, reparou a tempo e “eu logo vi, mas que prenda” e logo rematou: “Por aí vais é direito à Fonte Ferrenha”.
Estou a falar do nosso querido conterrâneo, “Baleiza” (Amândio Mourato) – paz à sua alma - que bastas vezes avistava por ruas e vielas desta velha cidade de Lisboa, que também amo.
José Morujo Júlio
02 setembro2020